Chegara ao Brasil com dezesseis anos em dezembro, meu aniversário dos
dezessete foi em abril de 1941. Bem vividos sob alguns aspectos,
testemunharam parte da história pouco nobre da primeira metade do século
XX. Eu era um inocente, um crédulo, um tímido, não imaginava a maldade, a
safadeza, a crueldade da alma humana. Eu era bom, gentil, alegre, educado,
nunca mentira em toda a minha ainda curta vida. Era um sonhador, via a
beleza sempre ao redor, amava os amigos, amava a vida, não sabia o que era
raiva, ódio, medo, temor. Era pródigo, o dinheiro no meu bolso era de todos,
minha casa era a casa dos amigos, eu era assim. Fui feliz e eu sabia que era
feliz. Por vezes meu "estopim curto", que não considero um grande defeito,
trazia-me encrenca. Gostava de esporte, de divertimento, minha sexualidade
era muito ativa, as mulheres fascinaram-me sempre. Sem ser um belo astro do
cinema, não precisei me empenhar muito nas conquistas, a todas eu tratava
com reverência, prostitutas e donzelas. Casei-me com a mais bela. A rendição
ao verdadeiro panorama, o despontar da realidade, da visão do feio, do ruim, o
que muitos consideram ser maturidade, chegou-me muito tarde, aos poucos,
sorrateiro, os ovos da serpente instalando-se em silêncio. O choque foi
violento, vivi o resto da minha vida como num ringue de luta, distribuindo
pancada, levando muita, caindo, levantando-me, às vezes derrubando o
oponente. Ganhei alguns rounds, perdi muitos, machuquei-me em demasia, fui
abençoado com cara de poucos amigos, mas não conheci o medo, enfrentei
com a coragem do desespero tudo o que vinha pela frente, aprendi a ser líder,
aprendi a engolir sapos, tive também recompensas, conheci como poucos meu
Brasil amado, sua natureza pungente, rios mares, a Amazônia cobiçada,
apaixonei-me pelo povo agreste, ajoelhei-me humilde diante da sua coragem.
Pergunto-me incessantemente, mesmo nesse instante: perdi ou ganhei? Valeu
a pena? Creio que as respostas agora nada significam. Se o sucesso dos meus
filhos é o meu grande troféu, valeu. Se o meu desapontamento com meu fim
de vida é o resultado, vale um zero. Não sei definir ética, comportamento
ético, o que significa? Fico me perguntando: o que valia na Grécia antiga, vale
hoje? Onde está a recompensa? A sociedade num todo se comporta de modo
duvidoso, por que então do indivíduo é cobrado o contrário? Desvio-me do
caminho, mas memória também é desabafo.
fragmento do livro Memoria Tumultuada de Iosif Landau
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9 commenti:
Hoje não vou ter muito tempo, Myra.
Lerei amanhã !
Um beijo.
Tão bom ler mais esses fragmentos da vida de teu irmão! bjs, chica
sim Chica eu estou pondo aqui alguns fragmentos do livro que ele escreveu..a vida dele..tao ligada a mim, logico e tenho tratado de matar as saudades imensas que tenho dele...mas nao e possivel..lendo relendo escrevendo , me da ainda mais saudades dele...
beijos e obrigada por compartir...
Myra, adoro como você fala do irmão, e como tem histórias lindas de vida e obra para contar. Viver, em resumo é isso. E você sempre foi plena. Bjs
sim Eduardo, ele tinha mto que contar e eu tambem....si agora ja nao vivo... ja vivi plenamente antes dos 90 :):):
bjs e que bomque veio aqui...
Muito interessante esta reflexão sobre a vida e a ética. Iosif Landau escrevia muito bem e de forma muito inteligente. Este percurso que tantos de nós fazemos da juventude até à vida adulta, tanta esperança e tanto que vamos observando já mais velhos, nos dias de hoje, nos deixam tantas interrogações sobre o lugar para onde o mundo caminha.
Gostei muito, muito.
Beijos
Branca adoro tudo que diz!!!!!
E o Iosif também velejava !
Por isso, a alma de poeta !
E a tua Mãe...claro que era muito bonita !
Tinha uns olhos penetrantes, como tu tens, Myra !
Um beijo muito amigo neste DIA DA MÃE !
minha mae era linda....um gde obrigada Joao...bjos mil
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