nessa manhã, o sol entrando pela janela
tento me lembrar se o cabelo dela era preto ou vermelho,
eu a conheci na porta do edifício, falou meu nome,
disse que estava à minha espera, eu não sabia quem era,
e a coisa rolou intensa entre tapas e beijos por algum tempo,
dividimos cama e mesa o verão inteiro,
nos despedimos numa tarde depois da sessão de cinema,
eu peguei o Circular pra Ipanema, ela o 155 para a Vila da Penha.
era casada, foi o que ela me dissera,
não me incomodei nem liguei pro fato de ela, cada semana,
inventar outra história, o pai o enxotara de casa,
a mãe era louca, a irmã prostituta, o irmão veado,
tanto faz como fez, eu tinha meu emprego e algum dinheiro,
mas não esqueci suas palavras de despedida:
— a gente se encontra por aí, qualquer dia,
e agora, tentando me lembrar da cor do cabelo dela,
senti saudade dos tapas e beijos, do seu cheiro de fêmea,
oh, destino cruel, perdi o emprego e sem dinheiro,
o passado, cortina pesada na minha vida de solteiro,
muitas mulheres passaram por ela,
mas nunca me esqueci do seu cabelo preto ou vermelho,
fui à sua procura pelas ruas pecaminosas de Copacabana,
entrei e saí pelos antros safados da Prado Júnior sacana,
num deles pedi uma cerveja gelada e petiscos salgados,
no palco mal-iluminado, ao som de ritmo quebrado,
uma mulher nua rebolava, meus pentelhos se ouriçaram,
era ela, o refletor iluminando a bunda ondulante,
e mais tarde quando a galera foi minguando
percebi-a de pé ao me lado e ela me falou:
— não te conheci em algum lugar distante?
respondi algo murmurando com os lábios cerrados,
ela me olhou, examinou as rugas na minha cara mal barbeada,
confesso que me senti um pouco embaraçado
quando ela se abaixou e beijou meus olhos embaçados.
no meu quarto ela acendeu um baseado e me ofereceu,
— pensei que nunca mais ia me procurar — ela falou,
em seguida apanhou na estante um livro de poemas
do Beat Allen e me entregou
e juro que cada palavra ali escrita era de paixão e dor
e queimava como brasa,
como se escrita pela minha alma apaixonada.
vivemos por algum tempo juntos
no meu conjunto quarto-e-sala,
havia música de amor durante a noite
revolução de paixões durante o dia,
mas logo a coisa azedou, a grana era pouca,
vendi tudo o que tinha, estante, livros,
Ginsberg, Kerouac, Corso e companhia,
ela ficou irrequieta, saía escondida, ia fazer a vida,
depois de algum tempo não mais voltou,
algo dentro de mim se apagou,
secou como inseto em teia de aranha,
continuei a viver por algum tempo como melhor podia,
pássaro engaiolado em triste memória.
estou de volta, à procura dela pelos antros safados,
2 commenti:
Ontem não pude ler, Myra.
Mas vou ler amanhã, 5ª feira !
tudo bem, ja sabe que nao e obrigacao:):):)
mais um beijo
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